Pesquisadora do LIEG tem texto publicado no jornal O Clarim

A convite do Coletivo de Mulheres Marília, eu, Bruna Oliveira, pesquisadora de iniciação científica do Laboratório de estudos de gênero, tive a oportunidade de escrever uma coluna para o jornal O Clarim, da cidade de Echaporã-SP, que foi publicado na edição 291 do jornal, no dia 22 de junho de 2022.
Atualmente estou com um projeto financiado pelo CNPq intitulado “Enfrentamento de Violência de Gênero na Universidade: situações de assédio e parcerias necessárias para além das fronteiras” em conjunto com o LIEG. Segue abaixo o texto na íntegra:

Que universidade queremos?
O livro “Um teto todo seu” reúne palestras que a escritora Virginia Woolf ministrou em
universidades da Inglaterra. Nessas palestras ela discorre sobre a diferença de educação que ela e suas irmãs tiveram em relação a seus irmãos homens, que puderam frequentar a universidade e obterem educação formal. Já ela, mesmo sendo uma palestrante, não poderia sequer entrar na biblioteca da mesma universidade que a convidou sem um acompanhante do sexo masculino. E a sensação da escritora é que mesmo estando fisicamente presente naquele espaço, ela não era completamente bem-vinda.
Mas e a universidade hoje? Segundo o INEP, Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais, já em 2017 as mulheres predominavam em cursos superiores no Brasil. O
Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) em 2019 também revelou que mulheres negras são maioria nas universidades públicas brasileiras, o que é consequência direta da política de cotas para negros, pardos e indígenas. Claramente é um avanço inegável desde os tempos da Virginia Woolf, mas essas mulheres que agora ocupam o espaço acadêmico se sentem bem-vindas?
As lutas das mulheres e minorias identitárias tem avançado. Os movimentos feministas tem abraçado lutas e resistências das distintas demandas sociais. Chegaram à periferia com pautas contra a violência, desigualdade salarial, assédio, liberdade reprodutiva e sexual, e não é diferente na universidade. E apesar das inúmeras resistências convivemos ainda com a permanência de um sistema formado por homens brancos, heterossexuais e elitizados que não acolhe essas transformações sociais dentro do ambiente acadêmico. O que antes era silenciado, abafado e mantido entre as paredes da instituição tem conseguido encontrar a atenção necessária dentro e fora da academia. Nos últimos anos temos visto notícias de alunas, alunos e alunes que não se calaram diante das violências sofridas dentro da universidade e passaram a se organizar e se manifestar contra o assédio no espaço acadêmico, enfrentando os comportamentos abusivos vivenciados e exigindo que a universidade se tornasse um espaço mais inclusivo, seguro e livre de assédio.
Para Sara Ahmed, escritora e intelectual australiana, o ato de denunciar expõe a vítima, que passa a ser estigmatizada, e precisa enfrentar a “mecânica institucional” que trabalha na contramão, dificultando o processo de reclamação pelos órgãos de gestão do sistema. Há resistência das universidades (além de outras questões como o corporativismo dos professores e morosidade das investigações) que dificultam o processo de reclamação e de acolhimento dessas vítimas. A presença de órgãos como “ouvidorias” e “corregedorias”, como parte das instituições acadêmicas que se colocam como um “ouvir especializado”, tem colaborado como um espaço de denunciar os comportamentos abusivos, como assédio moral, assédio sexual, racismos e LGBTQIA+fobia. No entanto as
ouvidorias acabam assumindo uma função de quantificação, gerando descrença coletiva por parte das reclamantes sobre a eficácia do sistema.
A partir de 2014, observamos diversos movimentos de resistência organizados pelos
estudantes, através de coletivos estudantis, sejam feministas, antirracistas e/ou anti
LGBTQIA+fobia, que fortalecem laços de proteção para as vítimas. Mas temos ainda um longo caminho a percorrer na divulgação de uma questão/situação que durante longo tempo viveu soterrada institucionalmente. Heloísa Buarque de Almeida, antropóloga e docente da USP, fala da existência de um currículo oculto na universidade: “Numa universidade aberta à entrada das mulheres (…) uma espécie de currículo oculto é posta em ação. Trata-se de um mecanismo de manutenção e reprodução de hierarquias, num processo de naturalização do impulso e da predação sexual como atitudes normais – mesmo entre homens dos cursos mais elitizados do país. Numa certa medida, se expressa assim como as desigualdades de gênero se reproduzem entre as elites universitárias.” Nesse cenário torna-se extremamente necessário a criação de políticas que buscam o fim da violência de gênero. Tanto no Brasil quanto na América Latina, algumas universidades tem se debruçado, cada uma a sua maneira, em investigar e propor alternativas, criando protocolos, comissões e tutoriais que visam a prevenção e enfrentamento do assédio e o acolhimento das vítimas, e precisamos com urgência nos dedicar a esse movimento de superação do assédio dentro do ambiente acadêmico, para que a universidade se
torne um lugar de convivência e permanência, e não apenas sobrevivência para os grupos
minoritários, que são as principais vítimas de assédio dentro do espaço acadêmico, seja esse assédio sexual, moral ou até mesmo psicológico.
Então, a questão que quero deixar para reflexão é: como sobreviver em um espaço acadêmico que não acolhe as vítimas? E essa questão da sobrevivência é algo muito discutido dentro do LIEG – UNESP e pela Sara Ahmed em toda sua obra, mas especialmente em seu último livro Complaint! (que seria Reclamação ou Queixa em tradução livre), no qual ela coloca o ato de reclamar como uma pedagogia feminista. Sara fala que devemos continuar batendo nas portas que não abrem, nas paredes que não quebram, mesmo que isso só cause barulho e descasque a tinta. Atrapalhar, reclamar e ser o que ela chama de “estraga prazeres” é o papel de toda feminista.

Sétimo encontro da Atividade de Extensão “Construindo Diálogos” – Sobrevivência e Oralidade: (ins) escrevendo vozes, corpos e existências.

As atividades do primeiro semestre de 2022 do Laboratório Interdisciplinar de Estudos de Gênero continuam! A nossa ação de extensão Construindo Diálogos “Sobrevivência e Oralidade: (ins) escrevendo vozes, corpos e existências” teve seu sétimo encontro no dia 23 de junho, com a exposição de Rosário Figari, professora e pesquisadora da Cátedra de Estudos para a Paz da Faculdade de Direito da Universidade Justus-Liebig de Giessen, na Alemanha.

A professora Rosário se disponibilizou para nos apresentar um pouco sobre sua pesquisa que diz respeito aos avanços e desafios diante da problemática da Justiça de Transição e da Violência de Gênero na América Latina. Sua apresentação foi dividida em 4 eixos temáticos: 1- O que é justiça de transição? 2- Como ocorreu a manifestação da violência de gênero no contexto de conflitos armados e ditaduras na América Latina? 3- Como a justiça de transição pode contribuir para o enfrentamento e reparação da violência de gênero no contexto de graves violações de direitos humanos? E, por fim, quais são os limites e desafios da justiça de transição?

A aplicabilidade da justiça de transição, segundo a professora, possui diversas abordagens e, dentre elas, a restaurativa, transformadora e ordinária foram apontadas e utilizadas em alguns países da América Latina pós período ditatorial ou de violação de direitos humanos. Na dinâmica da violência de gênero, segundo Rosário, durante as ditaduras do Chile e da Argentina, várias formas de violência sexualizada foram sistematicamente perpetradas por agentes das Forças Armadas, com o objetivo de desmoralizar e destruir física e psicologicamente aqueles detidos ilegalmente nessa época. Na Guatemala, 30 mil mulheres foram vítimas de violência sexual e a maioria dos atos foram cometidos por agentes do Estado durante o conflito armado no país.

Concluiu-se que as manifestações da violência de gênero, como instrumentos de disciplina social, foram utilizadas, de diversas formas, na América Latina durante períodos ditatoriais. De acordo com Rosário, a violência de gênero contribuiu para marcar e reproduzir hierarquias sociais de dominação e subordinação generificadas, de forma massiva e expansiva territorialmente. Nesse cenário, a impunidade foi e tem sido um fator crucial para a reprodução e legitimação dessa ordem de Gênero. É nesse sentido que, pesquisadores e pesquisadoras atentas aos mecanismos de manutenção dessas estruturas, como a violência de gênero, precisamos nos apropriar de teorias e conceitos que nos auxiliam, mais efetivamente, a compreender historicamente e socialmente esses instrumentos.

Sexto encontro da Atividade de Extensão “Construindo Diálogos” – Sobrevivência e Oralidade: (ins) escrevendo vozes, corpos e existências.

As atividades do primeiro semestre de 2022 do Laboratório Interdisciplinar de Estudos de Gênero continuam! A nossa ação de extensão Construindo Diálogos “Sobrevivência e Oralidade: (ins) escrevendo vozes, corpos e existências” teve seu sexto encontro no dia 09 de junho, com a exposição de Emilia Barbosa, professora assistente na Missouri University of Science and Technology nos EUA e pesquisadora-colaboradora do LIEG.

A professora Emilia fez uma exposição acerca do livro de Judith Butler, intitulado A força da não violência: Um vínculo ético-político (2021), que teorizou sobre como o uso da não violência utiliza instrumentos táticos da violência, principalmente pelo Estado e pelo sistema econômico que está inserido. O monopólio da violência, ou seja, a legitimidade em praticar a violência está somente nas mãos do Estado. Segundo Butler, esses aparatos são hábeis e conseguem manipular a “semântica da violência”, na medida em que possuem o poder de autorizar, desautorizar, censurar ou punir atos enquadrados como violentos.

A autora realiza essa análise ao partir de um olhar crítico diante a condição de vivência extremamente desigual em muitos Estado-nações ao redor do globo. A manutenção da desigualdade, permeada pelo racismo, sexismo, LGBTQIA+fobia e etc., se dá através da violência e da não-violência. Ao observar aquilo que Butler denomina de habitabilidade, a teórica realiza uma análise de como a falta ou mesmo a distribuição e acesso desiguais de infraestrutura, recursos materiais, alimentos, moradia e trabalho, são expressão das várias táticas da não violência.

O Estado, detentor da semântica e do monopólio da violência, não considera esse cenário de extrema precariedade como violento. É nesse sentido que na Introdução de seu livro, Butler contextualiza o leitor da realidade vivida pelos marginalizados, oprimidos e invisíveis, que vivem essa realidade. Logo, ao nos apropriarmos dessa leitura, o grupo do LIEG pôde refletir sobre a importância da aplicação e compressão do conceito dos usos da não violência, como recurso essencial para pesquisas que propõem essa postura crítica diante estruturas violentas e opressivas.

Quinto encontro da Atividade de Extensão Construindo Diálogos “Sobrevivência e Oralidade: (ins) escrevendo vozes, corpos e existências”

As atividades do primeiro semestre de 2022 do Laboratório Interdisciplinar de Estudos de Gênero continuam! A nossa ação de extensão Construindo Diálogos “Sobrevivência e Oralidade: (ins) escrevendo vozes, corpos e existências” teve seu quinto encontro no dia 26 de maio, com a exposição de Andréa Borges Leão, doutora em Sociologia pela Universidade de São Paulo e professora do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal do Ceará.

As discussões do nosso encontro foram centradas pelo artigo de Andréa Borges e Antonio Cristian Saraiva, intitulado Figurações de sobrevivência em Primo Levi. Diálogos com Norbert Elias, em que eles utilizam obras de Norbert Elias, assim como de outros pensadores sociais, para desvelar as figurações de sobrevivência na narrativa de Primo Levi. O texto possibilita reflexões acerca da historicidade do testemunho, da memória e oralidade, localizados em contextos específicos, que sofrem influência da percepção do Eu e do coletivo em que estão inseridos.

Ao tratarmos das figurações de sobrevivência, Andréa nos auxiliou a refletir sobre o sobrevivente, como encarnado na pessoa do Primo Levi, que é analisado por Philip Roth como observador em movimento. Nós, pesquisadoras que trabalhamos com oralidade, precisamos estar atentas a isso, pois os sobreviventes – pessoas que serão ou são entrevistadas na nossa pesquisa – dão testemunhos que apresentarão tanto a percepção da própria experiência da sobrevivência quanto a externa, do coletivo social. É nesse sentido que a memória e o observador não são categorias fixas, pois podem ser alteradas durante o processo do tempo pós-traumático, que refletirá na entrevista.

Portanto, o encontro foi muito importante para compreendermos, categoricamente, o que significa realizar uma análise histórica-social dos testemunhos de sobreviventes, inseridos nos mais diversos contextos. As metodologias de pesquisa na História e nas Ciências Sociais, como a pesquisa de campo e a entrevista, estão sendo revisadas e revisitadas pelo grupo, na medida em que temos construído olhares críticos diante esses métodos.

Quarto encontro da Atividade de Extensão “Construindo Diálogos” – Sobrevivência e Oralidade: (ins) escrevendo vozes, corpos e existências.

As atividades do primeiro semestre de 2022 do Laboratório Interdisciplinar de Estudos de Gênero continuam! A nossa ação de extensão Construindo Diálogos “Sobrevivência e Oralidade: (ins) escrevendo vozes, corpos e existências” teve seu quarto encontros no dia 12 de maio, com a exposição da Camila Rodrigues, professora da Rede Estadual do Estado de São Paulo e doutora em Ciências Sociais pela Universidade Estadual Paulista, campus de Marília.

A professora Camila apresentou sua pesquisa do doutorado e mestrado, diante das contribuições de Giorgio Agamben, em seu livro, intitulado O Que Resta de Auschwitz (1998). Agamben é um filósofo, autor de obras que percorrem temas que vão da estética à política e seus trabalhos mais conhecidos incluem investigações sobre os conceitos de Estado de Exceção, Homo sacer e a Vida nua e crua. De acordo com a pesquisadora Camila, no livro debatido, o autor objetiva compreender as dimensões da produção escrita dos sobreviventes do Holocausto nazista, a partir de uma análise profunda do papel do testemunho como documento histórico e de seus limites enquanto relatos pessoais.

Muitas das pesquisadoras do LIEG trabalham com mulheres ou pessoas vítimas de situações de violência, ou seja, sobreviventes. Esse conceito é essencial para compreendermos a posição de subordinação e vulnerabilidade dos sujeitos marcados e posicionados no sistema de gênero, raça, classe, geração, sexualidade e etc. É nesse sentido que, para Primo Levi e Giorgio Agamben, o testemunho é um documento histórico, pois permite que o relato se torne prova de fatos concretos. Nos casos de violência doméstica, tema do estudo de Camila Rodrigues, o testemunho não é suficiente para comprovar a veracidade dos acontecimentos. Isso ocorre devido ao fato de que as instituições policiais e jurídicas reproduzem práticas, comportamentos e falas permeados pela estrutura cultural e histórica machista e sexista.

De acordo com Camila, apesar das mulheres vítimas de violência disporem de espaços institucionais para realizarem denúncias, os mesmos não oferecem uma escuta acolhedora, pois não são propícios para que possam ser ouvidas. O acolhimento é precário por parte de alguns agentes jurídicos e policiais, que descredibilizam o testemunho das vítimas. Logo, foi possível visualizar e examinar o porquê da permanência e aumento dos casos de violência doméstica e a carência de políticas de gênero ou feministas, que pudessem amparar e diminuir os números das vitimadas. Com essa exposição, mais uma sessão da nossa atividade nos auxilia para construção de olhares e metodologias feministas, com o intuito de enriquecer nosso trabalho no grupo, enquanto coletivo ativo na Universidade.

Terceiro encontro da Atividade de Extensão LIEG 2022

As atividades do primeiro semestre de 2022 do Laboratório Interdisciplinar de Estudos de Gênero continuam! A nossa ação de extensão Construindo Diálogos “Sobrevivência e Oralidade: (ins) escrevendo vozes, corpos e existências” teve seu terceiro encontros no dia 28 de abril, com a exposição da Professora Valéria Barbosa Magalhães, docente da EACH/USP e coordenadora do Grupo de Estudo e Pesquisa em História Oral e Memória (GEPHOM/USP).

Nessa terceira sessão debatemos e refletimos acerca da discussão sobre ética nas pesquisas de história oral e das atuais perspectivas e casos dos comitês de ética em pesquisa. A fala da professora foi guiada a partir dos argumentos e ideias presentes em seu capítulo, componente do livro História Oral como experiência: reflexões metodológicas a partir de práticas de pesquisa. O debate foi essencial para reflexionarmos sobre as condições impostas a nós enquanto pesquisadoras e, especificamente, das questões de gênero e sensíveis à necessidade de estudar e olhar para o outro.

As metodologias e técnicas de pesquisa, em algumas das múltiplas correntes da História Oral, evocam tencionar as relações estabelecidas entre pesquisador e pesquisado. Partimos do entendimento de que o objeto do estudo, na realidade, possui agência e deve ser analisado conforme sua condição de sujeito ativo na sociedade. O LIEG, enquanto um grupo multidisciplinar, pôde apropriar-se de um fazer ciência que tenta subverter e alterar o modo como nos relacionamos com a pesquisa. Dessa forma, foi possível criar uma rede de pessoas resistentes aos moldes tradicionais da História e das Ciências Sociais, que nos aprisionam e limitam nossos meios de exercer a profissão.  

Primeiros encontros da Atividade de Extensão LIEG 2022

As atividades do primeiro semestre de 2022 do Laboratório Interdisciplinar de Estudos de Gênero já começaram! A nossa ação de extensão Construindo Diálogos “Sobrevivência e Oralidade: (ins) escrevendo vozes, corpos e existências” teve os primeiros encontros nos dias 31 de março e 14 de abril, com a exposição da Professora Lídia Possas e Beatriz Barreto, ambas vinculadas à UNESP-Marília, do livro Os Afogados e os Sobreviventes: os delitos, os castigos, as penas, as impunidades de Primo Levi.   

A coordenadora do LIEG, Lídia Possas, teve como objetivo introduzir o conceito de sobrevivência, a partir da perspectiva de Primo Levi, que foi levado para um dos campos de concentração de Auschwitz, em 1944. No final da Segunda Guerra Mundial, Levi era um dos únicos sobreviventes do carregamento de pessoas de seu trem. O ano de publicação do livro analisado foi 1986, no qual Levi reconstitui suas lembranças do cotidiano hostil no campo de Auschwitz e reflete sobre as condições políticas, sociais e culturais do período vivido.

A obra de Levi foi essencial para iniciarmos no aprofundamento de metodologias e teorias da história, que se apropriam da memória e do testemunho daqueles que sobreviveram a alguma situação traumática. Enquanto pesquisadoras/es das questões de gênero, é essencial considerarmos as perspectivas das pessoas posicionadas como vitimadas. Isso significa que compreender os mecanismos de violência, como a de gênero, demandam apropriação dos discursos produzidos por aqueles oprimidos.

A complexidade das consequências e resquícios causados por vivências perturbadoras precisa ser considerada, na tentativa de não realizarmos o que Primo Levi denomina de simplificações ou tendências maniqueístas. Assumir uma posição crítica, diante acontecimentos históricos ou pontuais de violência, humilhação, tortura e etc., exprime a necessidade de não reduzi-los a dois blocos, o das vítimas e o dos opressores. Verificar-se que existe opressão e oprimidos, mas admitir uma bipartição, como se houvessem personagens simplistas, esvazia a análise dos fatos.

Portanto, os primeiros dois encontros da nossa atividade de extensão fomentaram indagações, desconfortos e dúvidas. O nosso grupo do LIEG tem aprendido que compartilhar experiências de sobrevivência, assim como ouvir testemunhos, tornam nossas reuniões e pesquisas mais plurais e integrais, na medida em que acessamos cada vez mais a essas oralidades.

Avanços na UNESP em 2022 – direitos e equidade garantidos?

Em 2022, a assessoria estratégica de Ações Afirmativas, Diversidade e Equidade, da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, foi institucionalizada como coordenadoria em decisão do Conselho Universitário. Essa iniciativa representa um dos avanços da Universidade em direção à concretização de um ambiente mais justo e seguro para todas, todos e todes. Segundo notícia publicada no site oficial da instituição de ensino superior, o trabalho da coordenadoria é “identificar, diagnosticar e mapear culturas e práticas; e elaborar, planejar, acompanhar e avaliar políticas para a efetivação da equidade de gêneros; inclusão e respeito às diversidades; e enfrentamento – mas, acima de tudo, prevenção – de todas as formas de violência na Unesp”.

Na mesma direção da coordenadoria, a ouvidoria da UNESP tem apresentado também alguns avanços. Uma de suas funções, enquanto único órgão institucional de comunicação e informação da universidade, é disponibilizar atendimento e suporte à comunidade acadêmica. Apesar de algumas falhas e desvios em sua funcionalidade, a ouvidoria da UNESP, ultimamente, apresentou saltos qualitativos na tentativa de alertar e informar sobre algumas prerrogativas, como, por exemplo, a proibição do trote. Essa disposição resultou na elaboração e distribuição do folder anexado a seguir:

As pesquisas e trabalhos realizados pelo Laboratório Interdisciplinar de Estudos de Gênero (LIEG-UNESP), nesses últimos anos, estão e têm sido alinhados exatamente às propostas e iniciativas demonstradas acima. Nosso grupo tem identificado e apontado as emblemáticas dificuldades estabelecidas na permanência digna de mulheres, pessoas LGBTQIA+, pobres e pretas nos espaços universitários. Nesse sentido, algumas de nossas demandas de luta estão sendo atendidas nesse momento! Mas será que, de fato, significarão uma melhora na qualidade de vida e existência desses sujeitos na Universidade? Estaremos atentas/os ao trabalho da coordenadoria e da ouvidoria da UNESP, que reconheceram a importância de dar atenção e valor às vidas e corpos marginalizados e violentados nesses ambientes.

Dia Internacional das Mulheres – data de luta e reflexão

Hoje, 08 de março de 2022, é considerado o Dia Internacional das Mulheres e, normalmente, data de comemoração e homenagem à existência de mulheres. O grupo do LIEG posiciona-se de uma forma que pretender problematizar não só a comercialização, idealização e o desvio do aspecto político do dia de hoje, mas também trazer algumas reflexões: Quem consideramos mulheres hoje no Brasil? Qual a realidade de existência das mesmas? Quais nossas principais demandas e reivindicações de luta?

A partir de um posicionamento e perspectiva feministas não-hegemônica, consideramos que o movimento necessita considerar a multiplicidade das formas de expressão do gênero feminino e a complexidade das diferenças entre as formas de existência desse grupo. O feminismo do LIEG não é indiferente à questão racial, colonial e sexual. Isso significa que não ignoramos o fato de que SER MULHER significa ser ou estar em posições de vulnerabilidade e de opressão, com recortes históricos, sociais e econômicos de raça, classe, sexualidades, religião e etc.. Portanto, a existência das mulheres plurais está interseccionada por múltiplas formas de opressões, violências e invisibilizações.

Quem está na posição de vitimada? Por que mulheres brancas são vistas como meigas, desprotegidas e despreparadas e mulheres negras como agressivas e indestrutíveis? Por que as trans e travestis não são vistas nem como pessoas ou como mulheres? As violências estão atravessadas por diversos aspectos estruturais, históricos e políticos que moldam e determinam algumas existências. É nesse sentido que o dia de hoje é importante para darmos visibilidade à condição de vivência das mulheres no Brasil:

Violência contra a mulher aumentou no último ano, revela pesquisa do DataSenado”. Fonte: Agência Senado (09/12/2021).

Assassinatos de pessoas trans voltam a subir em 2020″. Fonte: Antra – Associação Nacional de Travestis e Transexuais (03/05/2020).

“Brasil registrou 140 assassinatos de pessoas trans em 2021: São Paulo foi o estado com maior número de ocorrências”. Fonte: Repórter da Agência Brasil – Brasília. (29/01/2022).

“61,8% das vítimas de feminicídio em 2020 eram negras”. “Mulheres negras concentraram índices piores de qualidade de vida quando comparado com mulheres brancas”. Fonte: Anuário Brasileiro de Segurança Pública, ano 15, 2021; Atlas da Violência, 2021; Visível e invisível: a vitimização de mulheres no Brasil, 3ª ed., 2021; Panorama da violência letal e sexual contra crianças e adolescentes no Brasil, 2021, UNICEF e Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

Os dados, índices, reportagens e notícias demonstram o porquê da data de 08 de março não poder estar distante da luta e das reivindicações que estão articuladas às práticas de (re)existirmos. A coletividade de mulheres, que não é homogênea e não pode ser analisada de forma generalista, encontrará sempre desafios e obstáculos no caminho da tentativa de simplesmente SER. Assim sendo, o dia de hoje demanda muitas reflexões, problematizações e mudanças para todos, todas e todes. Não queremos felicitações. Não queremos os “parabéns”. Não queremos flores, queremos a flor da vida, do respiro e de outra realidade de existência. Chega! Não nos calaremos e nem você deveria.

Novo Manual de Comunicação LGBTI+ é lançado com download gratuito.

A Aliança Nacional LGBTI+, da Rede GayLatino, lançou a terceira edição do Manual de Comunicação LGBTI+. O manual tem 112 páginas coloridas e ilustradas, e é o número 01 na série de 25 manuais que compõem a Enciclopédia LGBTI+. Está dividido em duas seções:

A – Conceituações e informações sobre questões LGBTI+: aborda temas como sexualidade, gênero e sexo biológico, orientação sexual, identidade e expressão de gênero, preconceito, estigma, estereótipo, discriminação, violência e conquistas e avanços.

B – Para abordar a população LGBTI+ na mídia: termos e comportamentos a evitar, sugestões de pautas da Aliança Nacional LGBTI+, datas para se pautar e bandeiras e símbolos.

O Manual tem distribuição gratuita e qualquer organização está autorizada a publicá-lo em seu site e mídias sociais. Links para baixar o manual:

Aliança Nacional LGBTI+: https://bit.ly/34gJGG4

Cedoc LGBTI+: https://bit.ly/3AATIOp

Grupo Dignidade: https://bit.ly/3r8W7g9